VIOLAÇÕES AO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

O consumidor é considerado um indivíduo vulnerável, mas quando se trata do consumidor infanto juvenil a legislação o considera como hipervulnerável, dessa forma não há dúvidas quanto à incidência do art. 6º, I, III e IV do CDC mas que deve, neste caso, ser complementada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Infelizmente, sozinho, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é insuficiente para proteger o público infanto-juvenil pois o ordenamento só surtiria efeito se a caixa de recompensas for reconhecida como jogo de azar, ou fosse ao menos reconhecida a sua característica de azar. 

Em síntese o ECA reconhece o caráter nocivo em apostas e jogos de azar aos menores. Neste sentido temos artigos 80 e 81, que impedem a permanência do menor em locais de aposta e proíbe a venda de bilhetes de loterias para menores, respectivamente.  O art. 80 do ECA disciplina que:

 

art. 80 Os responsáveis por estabelecimentos que explorem comercialmente bilhar, sinuca ou congênere ou por casas de jogos, assim entendidas as que realizem apostas, ainda que eventualmente, cuidarão para que não seja permitida a entrada e a permanência de crianças e adolescentes no local, afixando aviso para orientação do público.

 

José de Farias Tavares (2012. p. 72) trata que “nem mesmo em companhia de pais, tutores ou guardiões tais menores terão acesso a esses estabelecimentos”. O art. 80 proíbe tanto a permanência da criança e adolescente como a entrada em locais de apostas. 

Tal dispositivo é aplicável às fornecedoras dos jogos eletrônicos, sejam elas as próprias desenvolvedoras e publishers. Aplicado ao caso, as desenvolvedoras que exploram os jogos eletrônicos por meio das caixas de recompensas devem tomar medidas ativamente para prevenir e bloquear a criação de contas para os menores, proibindo que os jogos eletrônicos que tenham as caixas. 

No entanto, tal norma só seria aplicável caso as autoridades públicas considerassem os jogos eletrônicos, que tivessem a caixa de recompensas, como um “estabelecimento que explora o jogo de azar”. Neste sentido, os responsáveis pelos jogos eletrônicos precisam de autorização para seu funcionamento, no entanto as autoridades públicas do Brasil ficaram inerte, o presente trabalho não tem como objetivo analisar a omissão destes mas as autoridades não enxergam ou fazem questão de ignorar que os jogos eletrônicos com caixas de recompensas são nocivas, afinal “são joguinhos de internet”. 

Devo destacar também o art. 81, vejamos:

 

art. 81 É proibida a venda à criança ou ao adolescente de:

VI - Bilhetes lotéricos e equivalentes.

 

José de Farias Tavares (2012. p. 73) ensina que “A lei tem a finalidade de evitar o acesso prematuro a coisas que lhe são perigosas ou nocivas”, Ou seja, é proibida a venda de bilhetes lotéricos para os menores. Mesmo a loteria sendo legal, há o impedimento de que menores adquiram. Tal artigo pode repercutir sobre as caixas de recompensas.

A partir de uma interpretação sistemática pode existir um entendimento que por mais que não haja impedimentos para a comercialização de caixa de recompensas, por parte do poder público. Como a caixa de recompensas tem a característica de jogo de azar estaria, portanto, proibida a sua venda aos menores. 

O art. 81, IV admite “bilhetes lotéricos e equivalentes" abrindo uma brecha para aplicação deste artigo. Antes de mais nada é oportuno saber o que seria bilhetes lotéricos, para isso será necessário se socorrer a lei de contravenções penais no art. 51, §2º diz o que:

 

Considera-se loteria toda operação que, mediante a distribuição de bilhete, listas, cupões, vales, sinais, símbolos ou análogos, faz depender de sorteio a obtenção de prêmio em dinheiro ou bens de outra natureza.

 

 O termo “equivalente”, amplia o rol de bilhetes lotéricos e podendo muito bem a caixa de recompensas ser algo semelhante. Afinal, os desenvolvedores distribuem “caixas” como se fossem bilhetes e faz depender do sorteio ao abrir esta, para obtenção do prêmio. Desta forma, não é de se estranhar que em possíveis discussões judiciais seja suscitada a aplicação do art. 81, inciso IV do ECA, mas ainda é bastante cedo.

Neste sentido, as normas do Estatuto da Criança e Adolescente buscam proibir que os menores tenham contato ou estejam no ambiente de jogos que dependam da sorte. Neste sentido podemos argumentar pela proibição das caixas de recompensas em jogos eletrônicos para menores de dezoito anos, no entanto tal norma não surtir efeito de forma imediata, devendo o judiciário ou autoridade competente reconhecer que a caixa de recompensas é um jogo de azar. Agora partimos para as repercussões de ordem penal nas caixas de recompensas.

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